Última atualização em 17/01/2021, 13h18min por A Trombeta
Por Márcia de Freitas
Neste ano, mais especificamente no mês de maio, a morte de Benedito Calixto completou 90 anos. Mas quem foi Benedito Calixto? Para um morador da cidade de São Paulo é fácil identificar: é o nome da praça que fica no bairro Pinheiros, mais conhecida como a praça da Feira da Pulgas onde é possível encontrar “tudo” de, no mínimo, uns 40 anos atrás. Sim. É uma feira que começou com antiguidades e, hoje, tem um encontro de diversas gerações com antiguidade, artes e gastronomia. Além de emprestar o nome à praça, Benedito Calixto com certeza foi um dos grandes pintores, historiadores e estudiosos da imagem do final do século XIX e início do século XX.
Benedito Calixto nasceu em 14 de outubro de 1853, na então Vila de Nossa Senhora da Conceição de Itanhaém, litoral paulista. Suas pinturas estão espalhadas por diversos acervos. Parte das pinturas sacras que fez estão em igrejas no interior do Estado de São Paulo, mais precisamente em seis cidades. O acervo sacro se estende pela capital paulista – Igreja da Sé, Igreja de Santa Cecília, Igreja de Santa Ifigênia – além de museus em São Paulo como o Museu Anchieta, Museus de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (MASP), Museu de Arte Sacra de São Paulo, Museu Paulista da Universidade de São Paulo e Pinacoteca do Estado de São Paulo. No total são 128 pinturas religiosas registradas em nome de Benedito Calixto.
Vindo de uma família de católicos fervorosos, Benedito Calixto de Jesus – escolha do pai que preteriu o sobrenome dos seus antepassados ao nome do filho de Deus – tem uma formação que une pesquisa e respeito pela religião católica, tornando-o um pintor que aproveitou a formação religiosa com a formação técnica. Saindo de Santos, Calixto foi morar em Brotas, interior paulista, onde passou a trabalhar na restauração de pinturas sacras, com seu irmão João Pedro. A proximidade com o bispado e o reconhecimento como pintor, historiador e artista garante a ele a decoração das igrejas, inclusive no interior paulista que, seguindo o rastro da riqueza da cultura do café levanta os templos inspirados, na grande maioria, na arte renascentista e gótica. Os quadros, encomendados pela cúria, são de diversos tamanhos e formatos e vão decorar as igrejas.
A importância do artista plástico Benedito Calixto no final do século XIX início do século XX traz para o litoral paulista um olhar diferenciado na cultura brasileira tão acostumada a se fixar nos polos das capitais dos Estados, mas, principalmente, no Rio de Janeiro. No Brasil, a cidade do Rio de Janeiro é o encantamento das classes de todos os artistas. Da mesma forma que Paris era a efervescência da cultura na Europa.
E é na década de 1870 que começa a surgir o Impressionismo na França. E logo depois no Brasil. Em 1884 já existiam pintores ensinando paisagem ao ar livre no Rio de Janeiro, dentro da academia, mesmo contra a vontade dos acadêmicos.
Autodidata, Benedito Calixto faz sua primeira viagem à França em 1883, onde ficou por 18 meses. Depois de frequentar diversos ateliês de pintores impressionistas volta para o Brasil e se mantém fiel ao seu estilo. Da França traz a grande saudade que sentia da família e, uma máquina fotográfica.
A fotografia só vem a valorizar o perfeccionismo que Benedito já tinha. Estudioso da imagem ele passa a utilizar modelos vivos para suas fotos e, depois, utiliza a fotografia para compor suas pinturas.
As igrejas do interior
As igrejas cumprem um papel fundamental para as artes, seja na arquitetura seja como um museu aberto para a comunidade. Desde o Renascimento as igrejas católicas detém grande acervo de obras de arte são como um museu da comunidade. Na Europa, principalmente, é latente hoje a visitação em igrejas para a admiração das obras de arte nelas contidas.
No Brasil, mais especificamente no interior paulista, na maioria das vezes, essa comunidade admira as obras em sua função fática, isto é, com um olhar do cotidiano. Entretanto, é fundamental destacarmos que a igreja católica, há tempos, já “funciona” como um suporte às diferentes obras artísticas. E, no interior paulista, isso se consolida a partir desse ícone da arte brasileira.
As obras de Benedito Calixto em igrejas no interior paulista estão nas cidades de Amparo, Atibaia, Bocaina, Catanduva, Ribeirão Preto. E no litoral, em Santos. Destacamos duas delas: a Catedral Metropolitana de São Sebastião, em Ribeirão Preto, e a Igreja Matriz de São Domingos, em Catanduva.
Na Catedral Metropolitana de São Sebastião, de Ribeirão Preto, construída entre 1904 e 1920, a série de seis obras criadas por Calixto foi elaborada entre 1917 e 1920. O Interrogatório de Diocleciano, Primeiro Martírio de São Sebastião, e Segunda Condenação de São Sebastião, todos de 1920, estão localizados no lado direito do altar na capela-mor da Catedral. Restituição da Fala à Neófita Zoé, de 1917, A Comunhão dos Mártires, de 1918 e, Serás o defensor da Igreja de Cristo, de 1917, compõe o outro conjunto de telas, do lado esquerdo da capela-mor. A capela-mor é o local onde os padres ficam para a celebração das missas. Para um visitante comum, desavisado de que existam essas obras no altar, sairá de lá sem vê-las. A Catedral já impressiona pela belíssima construção com traços góticos. Para ter acesso às pinturas basta subir no altar, o que é totalmente permitido.
Catanduva
Na Igreja Matriz de São Domingo, em Catanduva, são 21 telas no total. No teto da nave central o óleo sobre tela mede 5m50cam X 3m. Impressiona, como em todas as obras de Calixto, a riqueza de detalhes e o realismo da cena. Nas laterais da nave principal estão 16 telas com todos os apóstolos: São Lucas, São Marco, São Matias, são Simão, São Judas Tadeu, são Jacó Menor, São Mateus de um lado; no outro São Pedro, Santo André, São Jacó, Maior, São João Evangelista, São Felipe, São Bartolomeu além do Profeta Elias e Profeta Ezequiel. São Paulo está representado em uma tela ao lado do altar. A tela Batismo de Cristo está localizada no batistério da Matriz. Para executar todas essas obras Calixto visitou, em 1925, a igreja quer ainda estava em construção e seria inaugurada no ano seguinte. Definidos temas e dimensões, todas as telas foram pintadas no ateliê do artista em Santos, com a colaboração de sua filha Pedrina que também era pintora. Desde sua inauguração as obras nunca haviam passa por nenhuma restauração, o que aconteceu há cerca de três anos, trazendo novamente a luz que existia na época da criação das obras.
Para conhecer mais sobre Benedito Calixto basta entrar no site da Pinacoteca Benedito Calixto (http://pinacotecadesantos.org.br/) e fazer o download do livro Calixto Digital, que também é interativo. A Pinacoteca fica em Santos, litoral paulista.
*Marcia de Freitas é jornalista e diretora da empresa Teia Comunicação